Havia um segredo na minha vida que guardei até há bem pouco tempo.
Eu sei que é vergonhoso num homem da minha idade, mas não sabia andar de bicicleta. Bom, para ser totalmente sincero, ainda não sei bem. Vou a direito, dou curvas - com um certo cuidado - mas não me consigo levantar do selim, o que me dificulta muito as subidas.
Bom, mas porque é que hoje venho com isto? No fim logo verão, como verão se tenho ou não razão em dizer que há coisas que só me acontecem a mim.
O Marcelino, que nunca desconfiou que eu era um excluído na arte de dominar a bicicleta (e ainda bem), aqui há tempos decidiu formar uma espécie de grupo de ciclo-turismo.
Quando me falou disso pela primeira vez, vi logo que ia ser um dos felizes contemplados com um convite para fazer parte do grupo. Ora sabendo da minha falha na coisa, tentei dissuadi-lo, invocando várias razões para não ir com aquilo para a frente: que as bicicletas são caras e a maior parte da malta que ele conhece é uma cambada de tesos, que também é preciso equipamento, que a nossa zona é muito acidentada, etc. Mas o gajo arranja resposta para tudo: disse que para o equipamento e para as biclas se podiam arranjar umas rifas, que se levariam as bicicletas até à beira-rio à mão e nos primeiros tempos treinaríamos aí, e só depois se iniciariam os percursos mais complicados, e por aí fora. "E tu vais ser o 1º convidado para a equipa" disse ele. Pois! tinha que ser!
Bom, vi que não me ia escapar e tratei de ver se conseguia arranjar forma de aprender. Uma coisa que não poderia acontecer era o Marcelino saber que eu era um biciclo-excluído, porque ele tem a língua solta e ia logo espalhar a notícia por todo o lado, especialmente na tasca do Mão de Ferro, e ainda ia gozar comigo à frente de toda a gente. Nunca me esqueço do que ele fez com o antigo dono da tasca, o Arlindo, que coitado, era corcunda, e ele só o tratava por marreco. Uma vez o Arlindo estava de mau humor e respondeu-lhe: Eu não me chamo marreco! Chamo-me Pombo! Arlindo Pombo! E o Marcelino, que só sabia que ele se chamava Arlindo, respondeu-lhe: Pombo? Eh pá, é a primeira vez que vejo um pombo com o papo nesse sítio!.
Portanto, já estão a ver o estilo do artista e ao que eu me sujeitava. De modo que fui ter com um tipo que sabe daquilo, e pedi-lhe se não se importava de me ajudar. Umas notas de 20€ fizeram o milagre, claro. Escolhemos uma bicicleta das mais simples - conselho do professor - mas mesmo assim a 1ª aula foi um desastre. Caí para aí umas 70 vezes. Ele bem me dizia para olhar em frente mas eu só olhava para o guiador ou como raio se chama aquilo, ou, quando muito para a roda da frente, e fui para casa cheio de arranhões, apesar das joelheiras, cotoveleiras e sei lá que mais eu levava vestido. A 2ª não foi muito melhor: consegui dar umas pedaladas seguidas, mas ao tentar dar uma curva, fui em cheio com um ombro contra uma parede, de maneira que ainda não estava curado dos arranhões e já estava com uma rotura muscular que me obrigou a andar 15 dias de braço ao peito. E o Marcelino de volta de mim, a querer tirar nabos da púcaro: "Eh pá, o que é que andas para aí a fazer, que estás todo roto? Andas-me a querer boicotar o projecto do ciclo- turismo, ou quê? Assim nunca mais começamos!" Não fiquei nada satisfeito com aquela do roto, mas também não quis adiantar conversa, que ainda era capaz de me descair. Quando fiquei melhor da rotura, lá recomecei com as lições, e aquilo lá foi evoluindo. O pior são mesmo as subidas, porque não consigo levantar o rabo de selim, e não me entendo com as mudanças.
Resumindo, fui adiando a inauguração da época do ciclo-turismo do Marcelino o mais que pude, mas no último fim de semana de Fevereiro, solarengo, não deu mais, que ele não parava de me chatear. E lá fomos para a beira-rio. "Ainda bem que isto não tem subidas" - pensei eu. "Assim o gajo não vai desconfiar muito que eu sou um bocado nabo nesta treta".
Andei sempre nas calmas na cauda do pequeno pelotão, até começar a sentir uma dor esquisita na nalga esquerda, e o pior é que não conseguia levantar o rabo do selim. Quando aquilo acabou foi um alívio, mas a nalga continuava a doer-me e cada vez mais.
Cheguei a casa despi-me e fui-me pôr ao espelho, a ver se conseguia descobrir a razão do incómodo. Dei umas voltas e lá consegui descobrir o que me pareceu ser uma enorme e vermelha borbulha. Tomei banho, comi qualquer coisa - em pé - e deitei-me (de lado).
Ora no outro dia, aquilo doía à brava e estava ainda maior, parecia uma ilha vulcânica no meio do Pacífico, e eu só me conseguia sentar de lado. Aquilo não era normal! Decidi ir ao Posto de Saúde. Quando o médico me perguntou de que me queixava, fiquei um bocado embaraçado mas lá acabei por lhe dizer o que se passava. "Mostre lá isso!" um bocado embatucado, lá fui baixando as calças devagar e ele exclamou: "Eh pá! Você tem aí um belo furúnculo! E pelo que estou a ver, vêm mais dois a caminho".
Fiquei para morrer! Sacana do médico: belo furúnculo??? E vinham lá mais dois???
"Mas eu nunca tive um furúnculo na vida. Não me diga que foi por causa do selim?!?!". E ele: "Ah você faz ciclismo?" e eu contei- lhe. E vai ele: "Então está justificado, há muita gente a quem crescem essas coisas quando fazem ciclismo" e explicou-me que aquilo se iria repetir, e que o conselho dele, era não voltar à bicicleta. E receitou-me uma pomada.
Bom, aquilo doía a valer, além do problema de só me poder sentar numa das nalgas. Mas ao mesmo tempo tinha um lado positivo: fornecia-me um pretexto para me ver livre das excursões ciclo-turísticas do Marcelino.
Agora alguém me explique como lhe vou dizer que não posso fazer mais aquilo, sem ter que lhe dizer que os culpados são uns furúnculos que me andam a crescer nas nalgas como cogumelos, sem correr o risco de ser achincalhado por ele, e através dele, pelo bairro inteiro!
Eu sei que é vergonhoso num homem da minha idade, mas não sabia andar de bicicleta. Bom, para ser totalmente sincero, ainda não sei bem. Vou a direito, dou curvas - com um certo cuidado - mas não me consigo levantar do selim, o que me dificulta muito as subidas.
Bom, mas porque é que hoje venho com isto? No fim logo verão, como verão se tenho ou não razão em dizer que há coisas que só me acontecem a mim.
O Marcelino, que nunca desconfiou que eu era um excluído na arte de dominar a bicicleta (e ainda bem), aqui há tempos decidiu formar uma espécie de grupo de ciclo-turismo.
Quando me falou disso pela primeira vez, vi logo que ia ser um dos felizes contemplados com um convite para fazer parte do grupo. Ora sabendo da minha falha na coisa, tentei dissuadi-lo, invocando várias razões para não ir com aquilo para a frente: que as bicicletas são caras e a maior parte da malta que ele conhece é uma cambada de tesos, que também é preciso equipamento, que a nossa zona é muito acidentada, etc. Mas o gajo arranja resposta para tudo: disse que para o equipamento e para as biclas se podiam arranjar umas rifas, que se levariam as bicicletas até à beira-rio à mão e nos primeiros tempos treinaríamos aí, e só depois se iniciariam os percursos mais complicados, e por aí fora. "E tu vais ser o 1º convidado para a equipa" disse ele. Pois! tinha que ser!
Bom, vi que não me ia escapar e tratei de ver se conseguia arranjar forma de aprender. Uma coisa que não poderia acontecer era o Marcelino saber que eu era um biciclo-excluído, porque ele tem a língua solta e ia logo espalhar a notícia por todo o lado, especialmente na tasca do Mão de Ferro, e ainda ia gozar comigo à frente de toda a gente. Nunca me esqueço do que ele fez com o antigo dono da tasca, o Arlindo, que coitado, era corcunda, e ele só o tratava por marreco. Uma vez o Arlindo estava de mau humor e respondeu-lhe: Eu não me chamo marreco! Chamo-me Pombo! Arlindo Pombo! E o Marcelino, que só sabia que ele se chamava Arlindo, respondeu-lhe: Pombo? Eh pá, é a primeira vez que vejo um pombo com o papo nesse sítio!.
Portanto, já estão a ver o estilo do artista e ao que eu me sujeitava. De modo que fui ter com um tipo que sabe daquilo, e pedi-lhe se não se importava de me ajudar. Umas notas de 20€ fizeram o milagre, claro. Escolhemos uma bicicleta das mais simples - conselho do professor - mas mesmo assim a 1ª aula foi um desastre. Caí para aí umas 70 vezes. Ele bem me dizia para olhar em frente mas eu só olhava para o guiador ou como raio se chama aquilo, ou, quando muito para a roda da frente, e fui para casa cheio de arranhões, apesar das joelheiras, cotoveleiras e sei lá que mais eu levava vestido. A 2ª não foi muito melhor: consegui dar umas pedaladas seguidas, mas ao tentar dar uma curva, fui em cheio com um ombro contra uma parede, de maneira que ainda não estava curado dos arranhões e já estava com uma rotura muscular que me obrigou a andar 15 dias de braço ao peito. E o Marcelino de volta de mim, a querer tirar nabos da púcaro: "Eh pá, o que é que andas para aí a fazer, que estás todo roto? Andas-me a querer boicotar o projecto do ciclo- turismo, ou quê? Assim nunca mais começamos!" Não fiquei nada satisfeito com aquela do roto, mas também não quis adiantar conversa, que ainda era capaz de me descair. Quando fiquei melhor da rotura, lá recomecei com as lições, e aquilo lá foi evoluindo. O pior são mesmo as subidas, porque não consigo levantar o rabo de selim, e não me entendo com as mudanças.
Resumindo, fui adiando a inauguração da época do ciclo-turismo do Marcelino o mais que pude, mas no último fim de semana de Fevereiro, solarengo, não deu mais, que ele não parava de me chatear. E lá fomos para a beira-rio. "Ainda bem que isto não tem subidas" - pensei eu. "Assim o gajo não vai desconfiar muito que eu sou um bocado nabo nesta treta".
Andei sempre nas calmas na cauda do pequeno pelotão, até começar a sentir uma dor esquisita na nalga esquerda, e o pior é que não conseguia levantar o rabo do selim. Quando aquilo acabou foi um alívio, mas a nalga continuava a doer-me e cada vez mais.
Cheguei a casa despi-me e fui-me pôr ao espelho, a ver se conseguia descobrir a razão do incómodo. Dei umas voltas e lá consegui descobrir o que me pareceu ser uma enorme e vermelha borbulha. Tomei banho, comi qualquer coisa - em pé - e deitei-me (de lado).
Ora no outro dia, aquilo doía à brava e estava ainda maior, parecia uma ilha vulcânica no meio do Pacífico, e eu só me conseguia sentar de lado. Aquilo não era normal! Decidi ir ao Posto de Saúde. Quando o médico me perguntou de que me queixava, fiquei um bocado embaraçado mas lá acabei por lhe dizer o que se passava. "Mostre lá isso!" um bocado embatucado, lá fui baixando as calças devagar e ele exclamou: "Eh pá! Você tem aí um belo furúnculo! E pelo que estou a ver, vêm mais dois a caminho".
Fiquei para morrer! Sacana do médico: belo furúnculo??? E vinham lá mais dois???
"Mas eu nunca tive um furúnculo na vida. Não me diga que foi por causa do selim?!?!". E ele: "Ah você faz ciclismo?" e eu contei- lhe. E vai ele: "Então está justificado, há muita gente a quem crescem essas coisas quando fazem ciclismo" e explicou-me que aquilo se iria repetir, e que o conselho dele, era não voltar à bicicleta. E receitou-me uma pomada.
Bom, aquilo doía a valer, além do problema de só me poder sentar numa das nalgas. Mas ao mesmo tempo tinha um lado positivo: fornecia-me um pretexto para me ver livre das excursões ciclo-turísticas do Marcelino.
Agora alguém me explique como lhe vou dizer que não posso fazer mais aquilo, sem ter que lhe dizer que os culpados são uns furúnculos que me andam a crescer nas nalgas como cogumelos, sem correr o risco de ser achincalhado por ele, e através dele, pelo bairro inteiro!
Eheheh, que grande problema! Como te vais desenvencilhar dessa não sei, mas depois conta... :)))
ResponderEliminarps - o Marcelino não sonha que tens um blogue, pois não?!? :D
Nem me fales nisso, Teté. Se ele descobre que tenho um blogue, então é que estou feito! :)
Eliminar(risos)
ResponderEliminarTenta nas ruas inclinadas, sempre ganhas balanço. A bicicleta tem é de ter os travões afinados.
P.S.: eu aprendi a andar de bicicleta aos 4 anos.
Não, Maya. Se vou para ruas inclinadas, depois como é que subo? :)
EliminarAhaha!!! Não sei o que é pior para o Marcelino gozar se o furúnculo ou o não saber andar de bicicleta, boa sorte.
ResponderEliminarNão, RST. Pior é mesmo o Marcelino! :)
Eliminar:D Estás tramado... Tens de aprender a levantar as nalgas do selim, ou arranjar vestimenta almofadada :) se arranjares alguma desculpa, por favor, conta-nos! E se não arranjares também! Boa sorte!
ResponderEliminar(note-se que deixei de andar de bicicleta depois de uma queda 'algo' ridícula, sou sensível a estas questões)
Nem com calções almofadados, TR. Acho que nunca mais vou pôr o rabo numa bicicleta (mas quando arranjar uma desculpa, eu conto :) )
Eliminar:D :D :D
ResponderEliminarAinda bem que avisaste sobre essa possibilidade do furúnculo! Agora é que não aprendo a andar de bicicleta... :)
Fazes bem, nêspera. Ao mesmo tempo, e com esta austeridade toda não sei se qualquer dia não teremos que andar todos de bicicleta
EliminarVai de tricicolo :DDD
ResponderEliminarSó se fizessem um triciclo muito grande, PE :)
Eliminardiz-lhe que tens uma fractura no cóccis que contraíste na caça ao javali. caíste ao dar um passo atrás quando o bicho investiu sobre ti, mas que lhe acertaste um zagalote mesmo no meio dos olhos. é de Homem!
ResponderEliminarÉ de homem e mentira, M. E o Marcelino é fino, não me parece que caísse nessa :)
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