sexta-feira, 6 de abril de 2012

Verdade ou Consequência - Guilty Pleasures

O Menino De Sua Mãe lançou um cross-posting "Verdade ou Consequência", ao qual aderi, e que no seu lançamento tem como tema os nossos "Guilty Pleasures". Levei tempo, porque, sinceramente tenho vários. No entanto, este de que falo até poderá constituir o desbravar de um terreno interessante, e para alguns, desconhecido.
Tem a ver com cinema. Cinema erótico italiano dos anos 80.
Até determinada altura, o cinema foi consumido pelo cinéfilo quase exclusivamente como um passatempo, apesar de um mínimo de exigência de qualidade, ter estado quase sempre presente desde os primórdios. Os Cahiers du Cinema, vieram a impor uma nova ordem especialmente do público europeu mais informado, e a exigência tornou-se maior, apesar de Hollywood continuar a dominar os circuitos comerciais.
Em Portugal, a partir de meados dos anos 60, uma certa intelectualidade seguidora fiel das teses dos Cahiers, impôs um paradigma quase radical sobre o que se via, o qual se veio a aprofundar com o 25 de Abril. Nessa altura e durante os anos seguintes, os cinemas toleráveis para quem queria aparecer como progressista junto do seu núcleo, eram alguns "estúdios", o Quarteto e o Nimas, que exibiam obras de "vanguarda", cinema da nouvelle vague francesa, de pequenos produtores independentes, ou clássicos de Murnau ou Eisenstein (sempre achei Eisenstein uma seca, mas lá tive que gramar uma vez o Couraçado Potemkin).
Por aí, portanto. Creio que se não fosse o aparecimento dessa corrente, e a obra de Manuel de Oliveira se resumiria hoje ao aniki-bóbó.
Porém, e confessando já aqui o meu gosto pela coisa chã, pelo instinto básico, muitas vezes pelo kitsch, nos anos oitenta, eu que já gostava especialmente do realismo italiano, fui apanhado completamente pela onda dos filmes italianos, muitos deles eróticos, produzidos por Salvatore Samperi, Dino Risí, Monicelli ou Etore Scola. Nunca percebi como não se poderia gostar igualmente de "O Leopardo" ou do "Malízia", do "Morte em Veneza" e do "Novos Monstros". Muitas vezes, tentar discutir sequer filmes como Malízia, uma obra-prima do erotismo mundial, parecia uma blasfémia. "Não, isso é abaixo de cão. Vamos falar de Godard".
E não era abaixo de cão. Era a vida tal qual ela era, com sentimentos básicos, fortes, telúricos até. Levassem a minha avó a ver um filme de Godard e ela sairia do cinema a perguntar-me "Mas que raio se passou ali?". Em contrapartida, se a levasse a ver os "Novos Monstros" ela perceberia muito bem que um dia poderia estar sujeita a acontecer-lhe o mesmo que à mãe de Alberto Sórdi no filme: ser internada num hospício por algum familiar tão falho de escrúpulos como Alberto.
De modo que, a certa altura, comecei a omitir dentro do meu círculo de amigos e conhecidos que ia ver filmes tão "básicos" como esses. Mas que eu apreciava e de que maneira. E foi com eles que conheci grande parte da obra de Risí ou Ferreri, ou actrizes maravilhosas - em todos os sentidos - como a já referida Antonelli, Edwige Fenech ou Ornella Mutti - essa mesmo que em 1994 foi considerada a mas bela mulher do mundo - ou actores monstruosos, como Sordi, Vittorio Gassman, Giancarlo Gianini, Ugo Tognazzi ou Massimo Ranieri.
Recordo mesmo cenas inteiras de alguns desses filmes, apesar de há muito não os ver. Com pena minha, que bem gostaria de rever alguns.
Este é pois, um Guilty Pleasure que está longe de me envergonhar.

4 comentários:

  1. Eisenstein uma seca? Oh, meu caro! Alexandre Newsky é um portento!Bom, mas não tenha problema com os filmes italianos que refere. Mtª gente, eu incluído, tb gosta.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Meu caro JC, acho o Alexandre Newsky uma excepção na obra de Eisenstein. Mas o Couraçado...que seca. Quanto aos outros, confesso que não entendo quem não gosta.

      Eliminar
  2. Ao cinema desses anos aconteceu mais o menos o mesmo que ao teatro: a mania das vanguardas e tal (vi poucos desses filmes, tanto duns como doutros) só não afastou a malta do cinema, porque havia muito mais para ver... E depressa os empresários também passaram a exibir essas "obras" nesses estúdios, enquanto nos grandes cinemas passavam os filmes que as "massas" gostavam, gostam e gostarão de ver - independentemente de algumas diferenças de gostos e critérios, obviamente! :)

    E por aí sou muito "massa"!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. É, Teté, eu também via tudo, a não ser que soubesse de antemão e por amigos de confiança, que não valia a pena :)

      Boa Páscoa!

      Eliminar

Eu leio todos com atenção. Mas pode não ser logo, porque sou uma pessoa muito ocupada a preencher tempos livres!