quinta-feira, 31 de maio de 2012

Quando a idade dá classe


Night' Music - Aztec Camera - Somewhere In My Heart



Aztec Camera - Somewhere In My Heart



La Alberca - um postal ilustrado de Espanha


Muito perto da fronteira de Vilar Formoso, talvez um pouco mais de uma hora de carro, encontra-se uma aldeia surpreendente: La Alberca. Surpreendente porque a arquitectura predominante não seria suposta ali. Aquelas, são casas que poderíamos perfeitamente enquadrar na paisagem alsaciana ou alemã, mas não ali, em plena Serra de Francia. 
E é no nome da serra que reside o segredo: aquela zona foi mandada povoar pelo rei Afonso IX nos séculos XII/XIII, e parte do fluxo migratória teve origem em França, através de D. Raimundo de Borgonha, nobre francês casado com D. Urraca.


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A aldeia situa-se a um pouco mais de 1.000 metros de altitude, e é enquadrada por belos bosques, tendo como fundo o inconfundível alto da Peña de Francia e os picos da serra, que em Abril, com o calor a obrigar-nos a andar já de manga curta, se mantinham ainda nevados. Mas se desse tipo de paisagem podemos encontrar em muitos lados, o mesmo não se dirá como atrás referi, da que se desfruta ao percorrer-se a intrincada malha urbana.


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La Alberca foi a primeira das várias pequenas aldeias espanholas a ser tornado Património Mundial, e as suas ruas mantêm a sua traça –tal como as casas perfeitamente conservadas na sua grande maioria – sendo tão estreitas que a maior parte da povoação não pode ser percorrida senão a pé. Como é normal em Espanha, dir-se-á que todas elas vão dar à Plaza Maior, rodeada de casas apoiadas em arcadas construídas sobre colunatas de granito, e pejada de esplanadas, que mesmo num dia de semana fervilham, a qualquer hora do dia


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A aldeia vive essencialmente de artesanato, e da sua produção de mel e de enchidos, mas é curioso verificar a quantidade de hotéis e restaurantes existente num lugar com pouco mais de 1.000 habitantes, a dar a bem a ideia da importância que o turismo ali tem


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Pegando no que antes disse, acrescentaria que percorrer algumas das suas vielas, especialmente se se estiver com fome, se pode transformar numa tortura, uma vez que o cheiro a enchidos e “jamon serrano” paira no ar com uma intensidade extraordinária, e nos entra pelas narinas, convidando a uma paragem no bar de tapas mais próximo. O porco, é portanto, uma presença incontornável, e os próprios autóctones decidiram demonstrar a quem os visita, a importância que o animal tem para eles.


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Para quem, como eu, gosta da paisagem humanizada, La Alberca é um verdadeiro achado, e o prazer que dá percorrer aquelas ruas, de casas iguais, mas todas diferentes umas das outras, é quase impossível de transmitir, por palavras ou imagens
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Noite de Fados na Tasca

Ainda não contei a 2ª parte do meu sábado ao cronómetro, mas não resisto a contar-vos antes um episódio que se passou há dias numa tasca que há na rua de baixo, e que já mencionei. Aquilo parece amaldiçoado, já mudou de dono 3 vezes só este ano e agora quem se atreveu a tomar conta da malfadada casa, foi o Leopoldo, que disse logo que com ele, outro galo cantaria. 
A 1ª iniciativa dele, foi, agora que se aproximam os santos populares, organizar uma noite de fado cujo prémio seria uma feijoada à transmontana para duas pessoas, que incluía uma garrafa de tinto, e o 2º prémio, uma semana de lanches, cada um constituído por uma bifana e uma mine.. 
O evento foi propagandeado através de uns panfletos escritos à mão e colados nos candeeiros das ruas circundantes, e teve lugar no penúltimo sábado. É claro que eu não podia perder um acontecimento tão relevante nesta nossa pequena, digamos, sociedade, cheguei cedo e foi o bem que fiz, uma vez que começaram a acontecer logo coisas dignas de registo. 
A 1ª foi quando chegou a nossa vizinha do 161. Trazia um vestido vermelho muito justo, e de decotes mais que generosos. Tanto que o Adelino que usa uns óculos que parecem fundos de garrafa, mas que não vê um boi, me disse que ela tinha o peito descaído. Ora ela estava de costas para ele, portanto... Como a noite estava fresca, ela trazia uma zibelina, que segurava enquanto se rebolava até à sua mesa. Bonito foi quando ela a tirou e ficou com as duas imponentes carecas gémeas à mostra. O Romão engasgou-se com o carapau de escabeche que estava a comer, e foi de tal maneira que deixou cair o capachinho para cima da sopa. Foi uma vergonhaça do caraças, e lá se voltou a malta toda a lemgrar que a alcunha dele era o Mona Lisa. Aquilo era para começar às 10, mas o Zeferino mais conhecido por "Camané das Trinas" estava um bocado grosso e caiu 2 vezes da mesa de pedra que servia de palco, mas depois de tratado, lá começou a cantoria, devidamente acompanhado à guitarra e à viola. 
Aquilo começou bem, com um fado em que cueca rimava com queca, e por aí já podem ver da elevação da coisa. 
Mas o momento da noite foi passado com o Gaspar e o com o cão do Vidal. O cão é enorme e o Vidal diz que ele come mais que a sogra, que é conhecida como a “Marabunta da Madragoa”. E vai daí, como estava a ir à falência por causa do animal, quis metê-lo num canil, mas a mulher não deixou,dizia que o animalzinho só lhe faltava falar e assim. 
Então ele decidiu obrigar o cão a fazer dieta, e deixou de lhe dar comer. Ora bem, o animal já há quase uma semana que não trincava nada e andava muito esquisito, com os olhos esbugalhados. Quando o dono o levava à tasca, se alguém se sentava de perna cruzada e mostrava um bocadinho de pele, o animal começava a arreganhar o dente e a rosnar baixinho, e já não tirava os olhos da perna exposta. Outro sinal de que se passava algo estranho é que o cão já tinha comido duas pedras do dominó ao Leopoldo, e agora o Vidal anda com ele muito bem preso. 
Estava o Quim dos Frangos a cantar um fado chamado “Fado do Branca de Neve e dos Dois Anões” e quando ele disse a palavra colchões, que por acaso rimava com anões, saltou-lhe a parte de cima da prótese dentária. O cão muito rápido soltou-se da trela, correu para a prótese e comeu-a. 
Bem! Nem imaginam o pandemónio que foi. O Quim começou a gritar: 
- Ai a minha placa, ai a minha placa, agora como é que eu como! - dizia aquilo com uma voz esquisita e pedia para meterem a mão pelas goelas do cão abaixo, mas a verdade é que ninguém se atreviacom medo de ficar sem ela. Até se falou em lhe ir fazer uma lavagem ao estômago, mas depois, face aos gastos que isso ia acarretar, optaram por esperar que a placa saísse naturalmente do organismo do cão. 
Imaginem!
Eu cá não voltava a usar aquela prótese!

quarta-feira, 30 de maio de 2012

The Italian Man Who Went To Malta



Night' Music - David Gray - Babylon


David Gray - Babylon


O Amor Platónico



Oh!Joe, por favor não me beijes!
Oh!Joe, por favor não me!
Oh!Joe, por favor não!
Oh!Joe, por favor!
Oh!Joe!
Oh...

Não é verdade que os beijos possam bastar.


O amor platónico é o tempo que vai do 1º encontro ao 1º beijo
(Paul Geraldy)


Os Meus Desportos Favoritos (2) . Beach Volley

Esperança

Ngaio Quigley nasceu num dia de Fevereiro de 1960, numa pequena ilha costeira da Nova Zelândia, no mar da Tasmânia, filho de uma Maori e de um neo-zelandês de 2ª geração, oriundo da Ilha de Guernsey. 
Desde cedo ficou patente aos pais que não era uma criança normal. Dormia pouco, passava o dia agitado e quase monopolizava a atenção de um adulto a tempo inteiro. À medida que ia crescendo, mais evidente ia ficando a sua diferença em relação aos outros garotos. Irrequieto, os acidentes eram uma banalidade, à sua volta o bulício era permanente. Pouco concentrado, as suas dificuldades de aprendizagem eram patentes e  os pais decidiram levá-lo a um especialista. 
A resposta veio rápida, o rapazinho era hiper-activo, remédios não havia, mas o médico indicou-lhes algumas medidas que considerava importantes para minorar os efeitos do problema, perigoso se não vigiado. 
E assim, no meio de muito sobressaltos e uma evolução diversa em relação à das outras crianças da mesma idade, seguiu até meio da sua adolescência. 
Foi quando Mary entrou na vida dele. Era uma rapariga calma, de 16 anos, de olhos azuis enormes, que pareciam conter neles toda a água do oceano, e um cabelo cor de trigo que emolduravam uma cara redonda e rosada, de faces constantemente afogueadas. 
Foi paixão à 1ª vista, um daqueles arroubos juvenis incontroláveis. Da parte dela havia só uma curiosidade por aquele rapaz moreno e desajeitado, sempre de riso pronto e em movimento constante. Tornaram-se amigos, que ele não lhe conseguia verbalisar o seu amor. 
Como que por milagre, Ngaio aquietou. Na presença de Mary era como se uma mão o acariciasse e lhe amainasse os espíritos. Seguia-a para todo o lado, parecia querer protegê-la, e obedecia-lhe sempre. Os pais do rapaz andavam felizes. Viam-no sereno como nunca e sabiam que deviam à presença da menina aquele mudança. 
Mas a situação era transitória. O pai de Mary era oficial da Marinha, e passado um ano teve que partir, levando a filha a reboque. Partiu desgostosa por deixar para trás aquele amigo de coração enorme, e que ela sabia que a amava com uma amor dedicado, fiel, sem limites. 
A ele deixou-o prostrado, parecia que toda a sua energia se lhe tinha esvaído num repente. 
Todas as tardes se vai sentar na pequena praia onde costumavam deitar-se lado a lado, mãos debaixo da cabeça, ora a falarem de trivialidades próprias da sua idade, ora a prepararem as lições para o dia seguinte, e olha o fio do horizonte por onde a sua paixão desapareceu. 
Ngaio nunca voltou a ser como era. O sofrimento tomou conta de si, mas a serenidade que ela lhe legou, mantêm-no. Passou a viver a sua vida de uma maneira contemplativa, quase sombria. 
E no entanto, algo o agita todos os dias, a esperança de ver Mary voltar, e que ao entardecer o arrasta até à praia, e o deixa a olhar o infinito.

terça-feira, 29 de maio de 2012

Nesta Noite de Lua Azul


Nesta noite de lua azul e de cansaço
Peço ao vento o perfume das violetas
E a ti, a brandura de um regaço

Night' Music - Creed - With Arms Wide Open

Creed - With Arms Wide Open

Aquelas frases que detesto (1)

A de hoje é:

"És linda por dentro e por fora"

Expliquem-me lá como é que se pode achar alguém lindo por dentro.
Então mas esta gente nunca viu um filme de canibais? Ou um filme em que haja um ou outro esventramentozito?
Aconselho por exemplo, a verem o "Hannibal", do Riddley Scott, especialmente aquela cena em que o Anthony Hopkins pendura o Giancarlo Gianini duma janela, lhe dá um golpe de uns 30 cmno abdomen e ele fica a baloiçar numa corda sobre a rua, e a olhar para os seus próprios interstícios a espalharem-se cá em baixo no chão-
Ou peçam para assistir a uma operação aos intestinos.

Tenho a certeza de que depois de uma experiência tão enriquecedora, nunca mais vão ter a tentação de elogiar
as miudezas de qualquer outra pessoa!

Os meus desportos favoritos (1) - Lingerie Football League




Praticar desporto dá saúde 
No caso supra, o desporto é só saúde

Em Bruges (2)

Prosseguindo o passeio por Bruges, e sempre com os canais e o ambiente de tempos passados a envolver-nos, desembocamos na grande praça central, um recinto rodeado por belíssimas construções medievais, das quais se destaca o neo-gótico do edifício municipal

Em todos os cantos se encontram pormenores encantadores, como o ‘De Steeghere', com os seus 48 nichos com estátuas, e á porta do qual se encontram os leões empunhando as armas da cidade.


Pode-se sempre optar por parar um pouco para almoçar num dos muitos restaurantes da cidade, almoço no qual não poderá nunca faltar a excelente cerveja belga. Embora outros países gozem da fama, a Bélgica é o país da cerveja por excelência - diria mesmo que tem as melhores cervejas do mundo, nomeadamente as concebidas em 6 dos conventos trapistas. É vulgar a cerveja caseira ou a micro-cervejeira.

Em Bruges existe uma cervejeira familiar chamada De Halve Maan que produz a Brugse Zot, que quer dizer O Louco de Bruges (esta era uma dubbel, que quer dizer que é de dupla fermentação), que foi provada e mais que aprovada.
Na Bélgica, cada marca - e são à volta de 2.000 - tem o copo próprio onde é servida.

Depois do almoço, continua-se o passeio, a pé ou a cavalo, descobrindo-se calmamente pormenores surpreendentes ou entrando-se numa das muitas chocolateiras para saborear um chocolate belga a sério. Ou numa das lojas de rendas de bilros, um dos orgulhos da cidade

Em Bruges, sai-se por uma porta, para logo se entrar noutra, onde as surpresas continuam…

Os últimos olhares a Bruges são para pequenos pormenores …

…e para as suas luzes artificiais, mesmo que na altura da visita os dias permanecessem luminosos. Mas sempre gostei dos candeeiros públicos. Talvez porque vi o Vasco Santana a falar com um, sempre os achei, de certo modo, um pouco humanos. E as velhas paredes por fundo...



E claro, a música de rua não podia faltar.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Night' Music (32) - Pixies - Here Comes Your Man

Pixies - Here Comes Your Man

A minha visão da Torre Eiffel, ou o que dá sofrer de vertigens


Então e da pinta do foto? Ninguém fala???

Para o S, quem a 28 de Maio de 2112 terá 116 anos

Hesitei muito antes de escrever o que segue. Por vários motivos que decerto descortinarão, ao lerem a história até ao fim. 
Peço-vos, aos que o lerem, para não procurarem nada nas entrelinhas. É que não vale a pena porque as não há. Por volta das 11 da manhã do dia 28 de Maio de 1996, recebi uma chamada no emprego. Do outro lado, a notícia de que o S. acabara de nascer. Pensei:"Safado! Adiantou-se 2 meses". Comuniquei que tinha que sair, e corri para a maternidade do Hospital de D. Estefânia, onde, depois de me ter identificado, uma enfermeira me levou ao berçário. Vários recém-nascidos, uns a berrar, outros mais calmos, olhavam sem ver, agitavam-se. Depois de uns segundos, apontei um: "É aquele, não é?". A enfermeira olhou-me incrédula: "Como é adivinhou?". Um feeling qualquer acho eu. 
(Uma nota que se impõe nesta altura do relato: o S. não é meu filho ou enteado.)
Prematuro, requereu alguns cuidados a princípio, mas depois começou a crescer normalmente como qualquer outra criança. Bonito, de cara redondinha e grandes olhos, cabelito alourado, tornou-se uma criança sociável, alegre e de bom discernimento. Foi razoavelmente rápido em tudo: no aparecimento dos dentes, a andar, a dizer a sua primeira palavra. Muito concentrado, achava-o, por vezes, demasiado sério para a idade. 
Começou a interessar-se por livros com figuras, especialmente aqueles em que apareciam animais. Aos 2 anos, tinha já um conhecimento razoável sobre eles, e conhecia mesmo os mais estranhos, tendo por vezes a dificuldade natural para a idade, em soletrar alguns nomes. Mas distinguia perfeitamente um gorila de um chimpanzé, ou um dromedário de um camelo. 
Aos 3 anos entrou para a escolinha e nós seguíamos a sua evolução com muita satisfação. 
Porém, num dia de Janeiro, já com 4 anos e meio, apareceu com os olhos inchados. Pensámos tratar-se de uma conjuntivite, levámo-lo à minha oftalmologista que achou aquilo estranho, mas considerou possível a hipótese da conjuntivite e medicou-o. Não resultou. Levado daí a 2 dias ao hospital, uma médica disse, mal o viu, que aquilo era um problema de rins e não era nada bom. Resumindo, e depois de todos os exames feitos, o S tinha contraído um síndroma nefrótico, doença pouco conhecida, de tratamento complicado. Ficou internado no D. Estefânia durante um pouco mais de 3 semanas, até voltar ao seu estado normal, através de um tratamento à base de cortisona. 
Aos poucos, fomos sabendo algo sobre a doença. 
1- que o doente, depois do 1º tratamento pode ficar curado; que pode não ficar curado, ter várias recaídas, mas que a doença pode desaparecer na mudança da idade; que pode ter recaídas durante toda a vida; que em casos extremos, pode dar origem a que necessite de fazer hemodiálise, e que tem havido mesmo casos fatais. 
2- que o tratamento seria sempre à base de cortisona o que além de poder provocar mais tarde problemas cardíacos, tem outros efeitos nefastos, como cansaço, apetite excessivo e o dificultar o crescimento físico e intelectual, entre outras coisas. 
O S esteve uns tempos bem, até que recaiu. Começou a fazer novamente cortisona, mas já sem necessitar internamento. Acabou a medicação, ficou uns tempos bem, e recaiu de novo. E assim foi a vida dele durante uns anos, bastava uma faringite para lhe provocar uma recaída. Tornou-se corticodependente. 
A certa altura tentou-se um tratamento com imuno-supressores que pareceu dar resultados - esteve 2 anos sem recaídas, mas no fim do ano passado voltou à cortisona. Nas primeiras recaídas, e devido ao cansaço, a médica até aconselhava que não fosse à escola durante uns dias, tendo em conta a dificuldade em controlar o esforço de uma criança nas suas brincadeiras com as outras. 
Víamo-lo crescer, nunca foi dos maiores, mas nada de anormal. A princípio, a minha preocupação residia no crescimento intelectual, mas ele continuava a aprender com facilidade, sendo sempre, se não o melhor da sua turma, dos melhores. 
Quando transitou para o secundário, não estranhou, mas chegou uma altura em que pareceu desinteressado. Foi então que a professora de Matemática chamou a mãe do S. à escola e disse-lhe que ele andava desinteressado, porque os seus conhecimentos já estavam demasiado adiantados em relação à matéria que estavam a dar e que aconselhava a que ele fizesse testes psicotécnicos para determinar as suas capacidades reais, mas que ela considerava que o S deveria transitar directamente do 5º para o 8º ano, opinião que nos surpreendeu enormemente. Descobrimos depois, que no princípio do ano, logo que a mãe lhe comprou o caderno de exercícios de matemática, ele tinha feito todos os exercícios do caderno durante a 1ª semana de aulas. 
Os testes e a avaliação efectuada pelo psicólogo especializado, corroboraram a opinião da professora de Matemática. Consideraram-se prós e contras, expôs-se o caso ao Ministério da Educação, mas como se achou demasiado um salto de dois anos, sugeriu-se que fosse colocado no 7º ano. Sugestão prontamente aceite, o nosso rapaz lá foi para uma turma de rapazes e raparigas que eram no mínimo, um ano mais velhos que ele. Ainda por cima, tinha fama de ser uma turma difícil. Corria pois o risco de ser alvo de bullying: era o mais novo, o mais pequeno, e era bom aluno. 
Surpreendentemente, viemos a saber tempos depois através dos professores e colegas, que o S era, pelo contrário, muito respeitado e ouvido, tendo mesmo sido nomeado, já no 8ºano, vice-delegado de turma, apesar de ser o mais novo de todos. Em termos de estudos, entrou para o quadro de excelência logo no 7º ano e nunca mais de lá saiu. Continuava muito interessado em ciências da natureza. Na altura, pensei que ele acabasse por ir para Biologia. 
Uma curiosidade: o S. com 12 anos no 8º ano, tinha como melhor amigo, um rapaz moldavo de 17 anos. Quando os via, parecia que o moldavo era uma espécie de guarda costas dele. Só alguns interesses de ambos diferiam: o S interessava-se pelo Magic (nessa altura já tinha ultrapassado a fase dos Pokemons), o jovem moldavo por raparigas. 
Outra curiosidade: nunca passou por aquela fase embirrante da adolescência. 
Outra: até ao 9º ano, o S nunca estudou. Os resultados dos seus testes tinham origem somente naquilo que absorvia durante as aulas. Alertado de que a partir do 10º ano as coisas iam ser difíceis, e que se queria fazer um curso de que gostasse e que valesse a pena, teria que estudar e trabalhar, ele próprio arranjou rotinas de estudo, ao mesmo tempo que, e mais uma vez, mudava de escola e de turma, novamente com grande facilidade de adaptação, e sempre com o respeito e amizade dos colegas, todos eles bem mais velhos que ele. Hoje no 11º ano, e no dia em que completa 16 anos, só tem colegas já com 17 e 18 anos. 
E apesar das faltas em alturas de recaída e que o prejudicam seriamente, no 2º período, teve 16 a Educação Física (uma estupidez esta disciplina contar para as médias) e a Português (a gramática dá cabo dele) 17 a Físico-Química, 18 a Biologia e Inglês, e 19 a Matemática e Filosofia, e naturalmente, continua no quadro de excelência. 
Como antes referi, houve uma altura em que o S me parecia demasiado adulto para a idade, muito sério. Hoje, tenho uma ideia muito diferente. Sempre muito bem disposto, encara a doença com o cuidado necessário, mas não a deixando tomar um peso excessivo na sua vida. Sobretudo, nunca admitiu passar por coitadinho, e nunca aceitou prerrogativas diferentes das dos colegas. Tem um sentido de humor fino, e, apesar da sua dedicação ao estudo, continua com as cartas do Magic e a jogar PlayStation. A leitura é outro dos seus hobbies. 
A última dele foi curiosa e ao mesmo tempo, diz bem do seu sentido de responsabilidade. Na semana passada dissemos-lhe: "Então, para a semana temos festa, é o teu aniversário!" Resposta dele: "Acho que vamos ter que adiar o aniversário. Para a semana tenho 4 testes ". 
Nunca tive ídolos na minha vida. Se tivesse que ter um, seria o S, que tem ultrapassado as vicissitudes da sua ainda curta vida com a força que muitos adultos não têm e com um sorriso nos lábios. A S. que no dia 28 de Maio de 2112 terá 116 anos.

domingo, 27 de maio de 2012

E veio-me esta canção à memória....

...quando fazendo zapping, passei pelo "A tua cara não me é estranha"
I Wonder Why
Frank Zappa - He's So Gay

De qualquer forma, é sempre bom recordar o grande Frank Zappa

Night' Music - Bill Withers - Ain't No Sunshine


Bill Withers - Ain't No Sunshine

Em Brugges(1)

A Bélgica tem algo que a identifica de imediato, o Manneken Pis.
A Bélgica já teve um dos maiores cantautores do mundo, Jacques Brel.
E um dos mais conhecidos e queridos detectives de sempre, Hercule Poirot.
A Bélgica pode-se orgulhar das suas magníficas cervejas, e de ser belga a melhor do mundo, a Westvleteren.
A Bélgica tem uma cidade que maravilha todos os que a visitam: Brugges. 
Conheço pouco da Bélgica. Só Bruxelas, que visitei aquando de uma estadia mais ou menos prolongada em Amsterdam, e que achei uma cidade bonita, cosmopolita, mas vulgar, pelo que só penso voltar por algum motivo ponderoso. E conheço Brugges, e se há um adjectivo para classificar Brugges, nunca será vulgar. Muito longe disso.
Bruges é chamada a Veneza do Norte. E mal se chega, à vista de tanta água por todos os lados percebe-se porquê. Mas sobretudo, é uma cidade medieval, extremamente bem preservada e cuidada.
O belga bem pode exibir com vaidade a cidade que poderá ser considerada o seu grande emblema turístico. Na verdade, chega a parecer inacreditável como toda aquela urbe resiste a séculos de erosão própria de um clima habitualmente tão agreste, como Brel tão bem descreveu numa das suas melhores criações, a bela e triste “Mon Plat Pays”, facto a que talvez não seja alheia a menor simpatia dos belgas.
Com muita sorte, a visita decorreu com um tempo surpreendentemente ameno, a roçar o estival, de tal forma que até os autóctones se mostravam admirados com a placidez dos dias, decidindo-se até muitos a aventurarem-se a passear de mangas curtas. Mal se entra no perímetro urbano, a Notre-Dame de Bruges, sobressai na imponência dos 123 metros de altura da sua torre.
Outra presença que se faz sentir com intensidade é a da torre de Belfry, que domina a praça central do burgo.
Por muitas voltas que se dêem, descobrir atentados urbanísticos é trabalho inútil. Dão-se voltas, e a a nós, tão habituados ás cidades descaracterizadas e desumanizadas, parece-nos sempre que aquelas casas não podem ser habitadas. A mim pareceu-me que viver numa delas, deve ser mais ou menos como viver num museu. Aliás, a cidade parece um museu a céu aberto.
Uma visita a Bruges passará sempre por uma ronda aos inúmeros canais num dos muitos pequenos barcos turísticos que fazem o circuito e que dão a conhecer ao turista, ângulos da cidade que de outra forma permaneceriam invisíveis aos seus olhos.
E como a viagem é longa, amanhã continua...

sábado, 26 de maio de 2012

Vistos e Revistos (8) - O carteiro de Pablo Neruda

Hoje era dia de vos deixar aqui a indicação de um filme, dos que fazem parte da lista imensa dos filmes da minha vida, e breves notas sobre o mesmo. Contudo, prefiro, às notas pessoais, um breve diálogo que diz muito do lirismo desse magnífico filme protagonizado pelo grande Philipe Noiret, "O Carteiro de Pablo Neruda"
Mario Ruopollo* - Gostava de ser também poeta  
Pablo Neruda - Não. É mais original ser carteiro. Anda-se mais e não se corre o risco de ficar gordo. Nós, os poetas, somos todos gordos  
Mario Ruoppolo - Sim, ma com a poesia poderia conquistar mulheres. Como posso me posso tornar poeta?  
Pablo Neruda - Tenta caminhar lentamente pela praia, até que a baía to permita.  
Mario Ruoppolo - E as metáforas? Virão ter comigo?  
Pablo Neruda - Certamente.

Depois deste diálogo, resta-nos tentar fazer da nossa vida uma eterna metáfora. Eu tento-o.

*Nota Breve - Massimo Troisi, que desempenha o papel de carteiro, muito doente durante a rodagem do filme, faleceu logo após o fim da sua rodagem