Ngaio Quigley nasceu num dia de Fevereiro de 1960, numa pequena ilha costeira da Nova Zelândia, no mar da Tasmânia, filho de uma Maori e de um neo-zelandês de 2ª geração, oriundo da Ilha de Guernsey.
Desde cedo ficou patente aos pais que não era uma criança normal. Dormia pouco, passava o dia agitado e quase monopolizava a atenção de um adulto a tempo inteiro.
À medida que ia crescendo, mais evidente ia ficando a sua diferença em relação aos outros garotos. Irrequieto, os acidentes eram uma banalidade, à sua volta o bulício era permanente. Pouco concentrado, as suas dificuldades de aprendizagem eram patentes e os pais decidiram levá-lo a um especialista.
A resposta veio rápida, o rapazinho era hiper-activo, remédios não havia, mas o médico indicou-lhes algumas medidas que considerava importantes para minorar os efeitos do problema, perigoso se não vigiado.
E assim, no meio de muito sobressaltos e uma evolução diversa em relação à das outras crianças da mesma idade, seguiu até meio da sua adolescência.
Foi quando Mary entrou na vida dele. Era uma rapariga calma, de 16 anos, de olhos azuis enormes, que pareciam conter neles toda a água do oceano, e um cabelo cor de trigo que emolduravam uma cara redonda e rosada, de faces constantemente afogueadas.
Foi paixão à 1ª vista, um daqueles arroubos juvenis incontroláveis. Da parte dela havia só uma curiosidade por aquele rapaz moreno e desajeitado, sempre de riso pronto e em movimento constante.
Tornaram-se amigos, que ele não lhe conseguia verbalisar o seu amor.
Como que por milagre, Ngaio aquietou. Na presença de Mary era como se uma mão o acariciasse e lhe amainasse os espíritos. Seguia-a para todo o lado, parecia querer protegê-la, e obedecia-lhe sempre. Os pais do rapaz andavam felizes. Viam-no sereno como nunca e sabiam que deviam à presença da menina aquele mudança.
Mas a situação era transitória. O pai de Mary era oficial da Marinha, e passado um ano teve que partir, levando a filha a reboque. Partiu desgostosa por deixar para trás aquele amigo de coração enorme, e que ela sabia que a amava com uma amor dedicado, fiel, sem limites.
A ele deixou-o prostrado, parecia que toda a sua energia se lhe tinha esvaído num repente.
Todas as tardes se vai sentar na pequena praia onde costumavam deitar-se lado a lado, mãos debaixo da cabeça, ora a falarem de trivialidades próprias da sua idade, ora a prepararem as lições para o dia seguinte, e olha o fio do horizonte por onde a sua paixão desapareceu.
Ngaio nunca voltou a ser como era. O sofrimento tomou conta de si, mas a serenidade que ela lhe legou, mantêm-no. Passou a viver a sua vida de uma maneira contemplativa, quase sombria.
E no entanto, algo o agita todos os dias, a esperança de ver Mary voltar, e que ao entardecer o arrasta até à praia, e o deixa a olhar o infinito.
Que história bonita e triste :(
ResponderEliminarParece que a Mary só apareceu para o "curar", como se fosse o remédio que ele precisava de tomar e que naquele tempo não havia...
Beijinho :)
Grato, Maria. Mas é um conto como outro qualquer, sem intenção de demonstrar nada :)
EliminarA saudades deixa-nos assim, sombrios, sem gozo de viver.
ResponderEliminarMas por vezes sabem bem, S* :)
EliminarQue belo conto de amor e amizade :)
ResponderEliminarGrato, Queen:)
EliminarVaporub, isto é muito bonito, mas deixou-me triste, contemplativa...*
ResponderEliminarMas não foi a intenção :)
EliminarOh... fiquei tão triste, sou uma eterna romântica, sempre na esperança de um final feliz. Não podes dar uma continuação à história?
ResponderEliminar:) . Não me parece Vera. Ia desvirtuar o espirito do conto :)
EliminarMuito bonito, o teu conto!
ResponderEliminarEmbora confesse que esse diagnóstico de hiperactividade nos anos 60/70 me espante, para mim é coisa mais recente... ou pelo menos nunca tinha ouvido falar disso nessa época, talvez só nos últimos 20/25 anos! :)
Não Teté, embora isso seja um pormenor, nos anos 70 até já se faziam tratamentos à base de anfetaminas. O problema há muito estava detectado :)
EliminarVerdade. Não havia o metilfenidato de agora, mas a hiperactividade já existia...mas ainda como diagnóstico raro, claro.
EliminarA Mary foi a anfetamina dele. E isso torna qualquer história bonita: quando a presença e o impacto das pessoas que passam pela nossa vida se tornam os nossos "medicamentos".
Adorei. E acho este final assim, excelente! :)
Gostei muito deste conto, apesar de me deixar um travo um agridoce. Mas quanto a mim é precisamente aí que reside a sua beleza.
ResponderEliminarÉ bom ter saudades. Saudades é o que fica quando a dor se vai embora.
Totalmente de acordo com a Anna Blue. Vic, muito bom :)
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