Já aqui referi o meu amigo Eduardo, e as suas excentricidades. Relatei mesmo, um episódio em que ele castigou com uma bengalada, um cãozito que se me agarrou á perna confundindo-a com uma cadela, quando estávamos à conversa na esplanada da Tentadora.
Deixem-me acrescentar que a paranóia do Eduardo com a sua bengala, que ele acha lhe dá um toque aristocrático é tão grande, que andou a tentar deslindar a árvore genealógica, e descobriu que um antepassado afastado, que teria vivido no séc. XVIII, era baronete, e ele já foi 2 vezes ao Registo Civil, a reclamar o título e que este lhe fosse averbado. Sem resultado, diga-se, para indignação do meu amigo Eduardo.
Pois esta semana, voltámos à Tentadora,
Sentámo-nos e o Eduardo, sempre agarrado à sua bengala de castão de prata, perguntou-me gentilmente como estava o meu pescoço. Respondi que estava melhor, e ele:
- Mas afinal o que se passou? Não me venhas com a história do pilates que não me convences. Isso teve a ver com o Kama Sutra que eu te emprestei, não? Talvez aquela posição da página 43? Por causa dessa, comigo, já duas gajas fecharam as pernas de repente, e partiram-me os óculos!
Bom, a conversa já me estava a cheirar mal, e fiz-me de mula
- E tu? Tens novidades?
- Ná, nem por isso. Ah! Espera, queres saber o que me aconteceu aqui há dias no 727? Entrei numa paragem ali à Pampulha, e sentei-me comodamente naqueles lugares reservados a inválidos e grávidas, e pus a minha bengala ao lado. Às tantas, aquilo começou a encher, já não havia lugares sentados, e aquela maralha toda em pé, apertadinha. Calhou logo ficar uma badocha mesmo ao pé de mim, com um saco na mão, e a agarrar-se a um dos varões. Nisto começa a rosnar que “já não havia cavalheiros”, e que havia “lugares para pessoas como ela, mas que havia abusadores a ocupá-los, e renhaunhau e coisa e tal”. Eu fazia de conta que não era nada comigo, “Bem te podes queixar. Vai mas é de pé que ainda é um favor que te faço, talvez assim percas umas gramas sem teres que ir ao Póvoas” e a gaja cada vez rosnava e suava mais, parecia uma torneira descontrolada. Até que cheguei à minha paragem. Levantei-me, toquei à campainha, apanhei a bengala e exibi-a a toda a gente só para a envergonhar. Depois, saí apoiando-me na bengala e fingindo que coxeava. Quando cá cheguei fora ainda olhei para a bazulacra. Estava branca como a cal. Deve ter apanhado cá uma vergonhaça!
Bom, ainda estive para lhe dizer que se calhar a mulher estava era mal disposta, mas calei-me, que com o Eduardo nem vale a pena.
Nesta altura, ele levantou-se e disse que ia á casa de banho. Quando regressou vinha pior que uma barata.
- Houve azar?
- Eh! Pá, tava ali um gajo ao balcão com umas botifarras calçadas que deu um passo atrás quando eu passei, e pisou-me mesmo em cima do dedo pequeno, que mo ia esmigalhando. Até me vieram as lágrimas aos olhos, e o sacana nem se virou para pedir desculpa. Já viste a educação desta gente?
- Se calhar, o homem nem deu por te pisar.
- Qual quê! Eu até já acho é que o gajo me tem de ponta e fez de propósito!
Se eu conheço o Eduardo, aquilo era mau sinal. Não tardou muito a confirmar-se que eu tinha razão:
- Olha, é aquele gajo que vem a sair. Já viste as botas? Aquilo devia pagar licença de porte de arma!
- Eu nem olhei para o homem quando ele passou por nós. Mas aí o Eduardo como que distraidamente, deixou escorregar a bengala e enfiou-lha entre as pernas. Claro que o homem se desequilibrou, gesticulou pateticamente à procura de algo a que se agarrar…e encontrou. Só que era o empregado que trazia o tabuleiro com 4 bicas, um pastel de nata e dois copos de água. Naturalmente que aquilo foi tudo pelo ar, juntamente com os dois tipos, acabando por cair em cima de ambos.
Bem…foi um pandemónio de se lhe tirar o chapéu, com os dois de cú no chão, a gritarem por causa das queimaduras provocadas pelo café quente. Enfim, lá se recompuseram e ainda pediram desculpa ao Eduardo quando viram que ele tinha sido atingido por umas gotas de água!
Levantei-me um bocado envergonhado e com o Eduardo atrás a rir-se disfarçadamente. Quando estávamos suficientemente longe para não sermos ouvidos, disse-lhe::
- Tu tás doido? Não tens vergonha?
- Vergonha? Não viste que ainda me pediram desculpa? Foi de artista!
Só que nessa altura olhei para trás e vi uma velha a falar com o empregado que andava a limpar tudo, e eu percebi pelos gestos que ela tinha percebido o que se passara e estava a contá-lo ao homem. Ele olhou em nossa direcção com um olhar daqueles que pode matar, e fez menção de correr para nós, mas já estávamos a uma distância considerável.
Resultado do café com o Eduardo: já tenho tal fama no ginásio que nem lá volto, e agora na Tentadora, sou dado como cúmplice de um atentado à integridade física de cliente e de um dos empregados, e dificilmente me atrevo a lá voltar.
Qualquer dia, sou um proscrito e tenho fotos espalhadas pelas paredes de Campo de Ourique com a legenda “Procura-se”
Mas que vergonha...
ResponderEliminarÉ para que vejas, S* :)
EliminarNão te queixes!
ResponderEliminarCom o Eduardo por perto, proscrito ou não, tens o teu dia ganho (na minha aldeia é assim que se diz quando há diversão, na certa!:))
Quanto à pergunta lá atrás, a resposta está no outro "velhinho".:)
beijocas
Já vi, Nina. Tens bom gosto :)
EliminarÉ pá, só não percebi quem o Luís, ali pelo meio...
ResponderEliminarE não gostei do Eduardo.
É que eu decidi mudar-lhe o nome, não fosse alguém conhecê-lo, Mam'Zelle. Mas houve 2 que me passaram :)
EliminarEheheheh! Foste apanhado! E foi por mim :p
EliminarVic, Vic... não tarda és persona non grata em metade da cidade... curioso é que quem não tem culpa nenhuma às vezes fica com a (má) fama toda :)
ResponderEliminarÉ o que eu digo, Elsa. Qualquer dia há para aí cartazes com a minha cara :)
EliminarA tua vida dava um filme e uma saga das mais emocionantes. tens amigos inimagináveis. Uma história digna de uma pelicula.
ResponderEliminarMas, conta-me,como está o pescoço. Já retiraram a coleira?
E a fisioterapia? Oxalá fiques a 100% muito rápidamente.
Um beijinho
Nem me digas nada, Pérola. Qualquer dia tenho que me mudar, ou ainda e dá uma síncope :)
EliminarO pescoço está melhor :) Obrigado
De facto, o melhor é não voltares a passar lá perto... já vi empregados de um café a juntarem-se em alcateia para atacar clientes :DDD
ResponderEliminarTão depressa, nem pensar, Palmier :D
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